O Vale de Apalta A uva começa a subir a montanha
Voltamos à van, refizemos parte do caminho, atravessando as montanhas de Lolol, e nos dirigimos para Apalta, onde a Vestiquero plantou 65 hectares com cabernet sauvignon, syrah, carmenère e merlot e de onde tira suas melhores uvas para produzir os vinhos ícones Vertice e Pangea. Felipe Tosso considera Apalta a “jóia da coroa” de Colchagua. Os vinhedos, ao contrário de Trinidad, onde estão na planície, aqui sobem pelas encostas das montanhas. Alguns parecem estar em ângulos superiores a 45°. “Apesar das nossas vinhas serem jovens, estamos fazendo alguns vinhos excepcionais”, informou Tosso, de dentro de um buraco mais profundo do que a altura de um homem, cavado na encosta para mostrar a composição dos solos de Apalta, que variam de rochoso-arenoso a argila vermelha, esta ideal para syrah e merlot.
Situado no sopé de uma serra ao sul, com elevação de 200-475 metros acima do nível do mar, e a uma curta distância do rio Tinguirica, o Vale de Apalta é caracterizado por um microclima perfeito para o cultivo de uvas premium. As temperaturas no inverno ficam entre 2° e 15°. O vale recebe cerca de 650 mm de chuva entre maio e setembro, e a irrigação por gotejamento sustenta as videiras durante a longa temporada de verão, bastante seca, quando as temperaturas ficam entre 12° e 31°. Até setembro, deveria ter chovido, pelo menos, 600 mm. Choveu apenas 400 mm até agora.
Para chegar ao ponto de observação, no alto da montanha, onde ocorreria a degustação e o almoço, foi preciso subir, caminhando, uma extensão íngreme de mais de 200 metros. Um trecho era tão ingreme, com mais de 45° de inclinação, que cai e quase rolei montanha abaixo. Foi preciso esperar, sentado no meio do caminho, pela chegada do Renato Frascino, que vinha logo atrás, para ele me ajudar a levantar do chão. Renato, o Salvador. Depois de uma leve descansada à sombra de uma árvore, na beira da encosta, conclui o percurso e cheguei ao mirador, de onde se tem uma vista deslumbrante do vale, lá em baixo, e dos vinhedos subindo a montanha, inclusive o Quartel 15, com 2,5 hectares, de onde sai o coração do Pangea, uma “mina de oro”, nas palavras de Felipe Tosso. O enólogo Hugo Salvestrin e os melhores vinhos da Ventisquero nos esperavam.
A degustação foi de cinco vinhos da safra 2010, tirados das barricas e ainda não engarrafados, para sentir a potencialidade do terroir e do que virá pela frente. Vinhos novos, com quatro meses de vida, um carmenère oriundo de três solos diferentes, com uvas plantadas no Quartel 4, a 300 metros de altura, em solo de argila com muita pedra. Outro, da Parcela 23, a 400 metros de altura, um LV (lomo vetado), como diz Tosso, o que seria equivalente a uma picanha com pouca gordura, 14,5% de álcool, uvas colhidas no final de maio. O terceiro vinho, um FM, ou filé mignon, oriundo de um solo com mais argila (Tosso é um amante da argila e de sua influência sobre as uvas e os vinhos. Fez até a sommelier Camilla Guidolin, do Leopolldo (SP), provar o gosto da argila). Depois, um LM (lomo liso), outro tipo de filé, dois vinhos syrah, mesma variedade, mas terroirs diferentes. Aliás, Felipe Tosso diz que o conceito de terroir é muito forte, mas sempre é necessária a intervenção intelectual. Degustamos outros FM, originários de uvas plantadas a 260 metros de altura, consideradas o “coração” de Pangea, e em maior altitude, 470 metros, o “coração” de Vertice. Estes vinhos ficarão de 15 a 18 meses em barricas de carvalho francês extra-finas.
Terminada a degustação, fomos ao aperitivo, com um aromático Sauvignon Blanc Yelcho, do Vale de Lolol, muito bom, que chegará ao Brasil por R$ 38,00,acompanhando “quesillo com aji verde”,queijo fresco chileno, de vaca, macio, com pimenta verde. A vista, para todos os lados, maravilhosa: à direita e à frente, as altas montanhas; à esquerda, o vale de Apalta. O sol estava radiante e diminuia o frio do vento constante.
O almoço começou com ceviche chileno, menos aromático que o tradicional peruano, com menos limão, acompanhado por dois vinhos brancos. O já citado Yelcho Sauvignon Blanc, mais o Chardonnay Queulat 2008, ambos deliciosos. Seguiu-se um cordeiro com alecrim e purê de grão de bico, harmonizado com Syrah Grey 2008, que no Brasil é vendido por R$ 80,00, e um Carmenère/Syrah Vertice 2006, um dos ícones da Ventisquero, que chega aqui por R$ 140,00. Depois, um Syrah Pangea 2006, o melhor syrah que já bebi, potente, elegante, que custa R$ 220,00 aqui.
Na conversa, Felipe Tosso falou sobre os esforços da Ventisquero e de todo o setor vinícola chileno para aumentar as exportações de vinhos e conseguir preços mais compensadores com o aumento da qualidade do produto. A empresa exporta 1 milhão de caixas e quer aumentar em 20%, principalmente para Inglaterra, Estados Unidos e Brasil. No Chile e no Brasil, é a primeira em vendas de produtos com marca própria. O almoço, os vinhos e a conversa estavam tão bons que o ágape, como dizia minha avó, terminou às 17h20min.
Descemos o morro e rumamos para Santiago.
Nenhum comentário:
Postar um comentário