quarta-feira, 3 de outubro de 2012

A safra 2012 é boa, mas não excepcional



        860 enófilos participaram da bela festa de avaliação dos vinhos
Fotos Gilmar Gomes

A 20ª Avaliação Nacional de Vinhos, realizada pela Associação Brasileira de Enologia, no final do mês de setembro, em Bento Gonçalves, mostrou que a safra brasileira de vinhos 2012 não é excecpcional, assim como vinham dizendo e escrevendo alguns, mas, mesmo assim, será uma boa safra. A opinião não é só minha. É de enólogos que lá estavam e contaram episódios climáticos ocorridos durante a safra, em algumas regiões, outros especialistas e as notas do 16 degustadores, alguns de destaque internacional, que provaram os 16 vinhos mais significativos da safra.
Vou dedicar esta edição do Blog à Avaliação, publicando alguns textos que já escrevi, e, mais tarde, vou me dedicar a contar a bela viagem que, em companhia de um grupo de colegas jornalistas e chefs de cozinha, fizemos por 18 vinícolas de Flores da Cunha e Bento Gonçalves, nos dias que antecederam à Avaliação, num belo e instrutivo programa montado pelas agências de informações Conceito.com, de Lucinara Masiero, e Dialoga, de Janquiel Mesturini. O pessoal era muito bom e simpático e foi uma caravana muito alegre. Vamos, então, à Avaliação:
01 – O auê que foi feito em torno da qualidade que teriam os vinhos da safra 2012 não apareceu nas taças nem nos comentários dos avaliadores da 20ª Avaliação Nacional de Vinhos, realizada, sábado, 29 de setembro, em Bento Gonçalves, com o exame dos 16 vinhos mais representativos da safra, escolhidos, anteriormente, por 120 enólogos, que examinaram 387 amostras, inscritas por 70 vinícolas. Os 16 degustadores, vindos de vários países, como China, Cuba, Holanda, Argentina e Uruguai, além do Brasil, para a etapa final, deram notas que ficaram na média dos 80 pontos. Entre os brancos, somente dois chardonnay conquistaram 90, o da vinícola Luiz Argenta, e 92, da cooperativa Nova Aliança, ambas de Flores da Cunha. Entre os tintos, também apenas dois conseguiram notas acima de 90, o tannat da vinícola Antônio Dias, com 90, e o tannat da Almaden, com 92 pontos. Os demais classificados entre os 16 vinhos mais representativos da safra 2012 foram vinhos base chardonnay da Domno; chardonnay-pinot noir da Miolo e da Geisse; chardonnay da Goes e Venturini e da Basso; e moscato da Perini; entre os brancos, e gamay, da Salton; teroldego, da Don Guerino; merlot da Almaúnica; cabernet sauvigno da Guatambu; cabernet sauvignon da Aurora; e marselan da Casa Valduga.
Mas não se pode generalizar que a safra foi totalmente ruim. A própria média de pontuação, na casa dos 80 pontos, demonstra isso. Além do mais, alguns enólogos explicaram que algumas regiões tiveram mais problemas que outros. Na região de Candiota, por exemplo, dois dias com chuvas de 80 ml, derrubaram muitas uvas tintas. O estrago foi tanto que a Miolo não fará, este ano, seu vinho top, o Sesmarias. As uvas não tiveram qualidade para tal, informou o enólogo Miguel Almeida. Já em Encruzilhada do Sul, o clima foi favorável para as uvas brancas e o enólogo Antônio Czarnobay garante que há muito tempo não via chardonnay com tal grau de açúcar. Em Livramento, na Almaden, não houve problema, como demonstra a extraordinária qualidade do Velhas Vinhas Tannat, destacado na avaliação com a maior pontuação entre todos. Além dos degustadores, 840 amantes do vinho acompanharam a avaliação.
02 - A 20ª Avaliação Nacional de Vinhos, organizada e realizada pela Associação Brasileira de Enologia, presidida por Christian Bernardi, mostrou a enólogos, enófilos, jornalistas e mais de 860 amantes do vinho a qualidade da safra 2012. Foram indicados os 16 vinhos mais representativos. De acordo com as notas de 16 degustadores do Brasil e de outros sete países e da opinião de alguns enólogos ouvidos pelo JN, a safra foi boa, mas não excepcional, como se vinha dizendo que seria. Apenas cinco vinhos alcançaram notas 90 e 92 na opinião dos degustadores. Os demais 11 ficaram entre 82 e 89 pontos.
As notas de cada vinho, dadas pela comissão de seleção inicial (120 enólogos), pela mesa degustadora (16 avaliadores), pelo degustador e por este repórter, mostram as diferenças de gostos . Comecemos pelos brancos: chardonnay Domno, seleção 89, mesa 88,5, degustador 90, repórter 89; chardonnay-pinot Miolo, seleção 89, mesa 88,5, degustador 89, repórter 81; chardonnay-pinot Geisse, seleção 88, mesa 88,5, degustador 89, repórter 86; chardonnay Luiz Argenta, seleção 88, mesa 88, degustador 90, repórter 85; chardonnay Góes & Venturini, seleção 89, mesa 89, degustador 89, repórter 84; chardonnay Nova Aliança, seleção 89, mesa 88, degustador 92, repórter 89; e chardonnay Basso, seleção 88, mesa 88,3, degustador 88,5, repórter 88; moscato Perini, seleção 87,mesa 88, degustador 87, repórter 88.
As notas dos tintos: gamay da Salton, seleção 89, mesa 87, degustador 82, repórter 86; teroldego da Don Guerino, seleção 87,5, mesa 86,5, degustador 88, repórter 89; merlot da Almaúnica, seleç~são 89, mesa 88, degustador 89, repórter 87; cabernet sauvignon da Guatambu, seleção 88, mesa 89, degustador 87, repórter 81; cabernet sauvignon da Aurora, seleção 89, mesa 88, degustador 89, repórter 87; marselan da Casa Valduga, seleção 89, mesa 89, degustador 89, repórter 89; tannat da Antonio Dias, seleção 89, mesa 88, degustador 90, repórter 88; tannat da Alamden, seleção 90, mesa 90, degustador 92, repórter 89.
Muitos enófilos que acompanham certames de vinhos no Brasil se perguntam por que a maioria dos degustadores dificilmente passa da nota 90. De acordo com enólogos, é a chamada “nota confortável”. Não se erra muito!

Os 16 degustadores. O de veremlho é Horst Kissmann
Fotos Gilmar Gomes
03 - Os avaliadores vieram de oito paíes, contando o Brasil: os brasileiros foram Alberto Miele, Daniel Dalla Valle, Gilmar Pedrucci, Horst Kissmann, Iran Castro, João Leme, José Alcides Munhoz, Silvia Mascella Rosa; Inês Cruz, Portugal; José Lez, Uruguai; Paulus Op Ten Berg, Holanda; René Garcia, Cuba; Ricardo Godoy, Argentina; Roberto Zironi, Itália; Ronny Lau Wai Man, China. O 16º degustador foi sorteado entre o público e, infelizmente, não peguei seu nome. Só sei que é de Santa Maria, no Rio Grande do Sul.


04 - Descrição Sensorial dos 16 vinhos representativos realizada pelo painel de degustação da ABE. Foram coletadas as palavras e expressões mais frequentes da descrição feita por 30 enólogos, às cegas (inclusive da variedade), durante a degustação de confirmação, de 12/09/2012.
Categoria: Vinho Base para Espumante
1. VINHO BASE ESPUMANTE (Chardonnay): aspecto límpido e brilhante; de pouca intensidade, amarelo-palha, com leve nuança esverdeada. Aroma limpo, franco, delicado, notas de flores brancas (grinalda), acácia, abacaxi, frutas cítricas, mel, banana, maçã verde e peras maduras. No paladar tem uma acidez marcante, equilibrado em álcool, corpo de média intensidade e bom volume. É persistente de sabor.
Domno do Brasil - amostra 191
2. VINHO BASE ESPUMANTE (Chardonnay/Pinot Noir): leve intensidade de cor, tonalidade amarelo-palha claro, esverdeado. No nariz apresenta uma intensidade média, é delicado, fino, com notas de frutas brancas, maçã, pera, pêssego, abacaxi, marmelo, frutas cítricas e leve floral. No sabor apresenta uma moderada acidez, boa cremosidade, é elegante e delicado, de boa intensidade e estrutura. Tem um bom volume e é persistente em boca.
Vinícola Miolo - amostra 97
3. VINHO BASE ESPUMANTE (Chardonnay/Pinot Noir): coloração brilhante, amarelo-palha, sutil nuança salmão. Aroma de média intensidade, fino, delicado, com notas de frutas maduras, cítrico, traços de levedura, maçã, mel, pêssego e flor de laranjeira. Paladar fino, de acidez pronunciada e de bom frescor. Médio corpo e bom volume. É leve, um pouco ligeiro, com retrogosto agradável.
Vinícola Geisse - amostra 67
Categoria: Branco Fino Seco Não Aromático
4. CHARDONNAY: aspecto brilhante, amarelo claro/esverdeado. Aroma de intensidade média, delicado, fino, floral, com notas de frutas cítricas, carambola, lima, maçã verde, pêssego, marmelo, pera, maracujá e sutil nota vegetal. Sabor com acidez viva, equilibrada, marcante, de médio corpo e média estrutura. Possui um bom volume, certa doçura, é leve e refrescante. O retrogosto é delicado e prolongado.
Luiz Argenta Vinhos Finos - amostra 259
5. CHARDONNAY: aspecto brilhante, amarelo-palha esverdeado. Aroma de média intensidade, elegante, fino, notas de banana, sutil frutas tropicais (goiaba, mamão, maracujá, melão e abacaxi). Também apresenta notas de cítrico, flores brancas, maçã e pera. Ainda, aroma de amêndoas, leve amanteigado e mel. Paladar com acidez equilibrada, justa, um médio corpo, macio, de bom volume e bom retrogosto. Possui um sutil amargor no final de boca e uma excelente persistência.
Vinícola Góes & Venturini - amostra 383
6. CHARDONNAY: coloração límpida, brilhante, amarelo (variações entre dourado leve a palha/esverdeado). Aroma intenso, elegante, fino, com notas de abacaxi, frutas de polpa branca, pêssego, banana, maracujá, melão, papaia e pera. Notas de cítrico e sutil baunilha. Paladar intenso, potente, agradável, equilibrado, elegante e de bom volume. A acidez é equilibrada, relativamente baixa. O sabor é nítido e bastante frutado, de boa untuosidade, bom corpo e volume, muito persistente.
Cooperativa Vinícola Nova Aliança - amostra 232
7. CHARDONNAY: coloração de média intensidade, límpido, brilhante, amarelo esverdeado. Aroma de boa intensidade, elegante, fino, com predomínio de notas de abacaxi, frutas maduras, sutil frutas tropicais, notas de amanteigado, toques de arruda e manjericão. Carvalho presente/marcante, com notas de baunilha, caramelo, amêndoas e intenso tostado. Paladar intenso, com ataque doce, equilibrado em acidez e no conjunto; é potente, encorpado, agradável, com um tom adequado do carvalho e boa persistência.
Basso Vinhos e Espumantes - amostra 218
Categoria: Branco Fino Seco Aromático
8. MOSCATO BIANCO R2: coloração límpida, brilhante, amarelo claro/pálido, com reflexos esverdeados. Aroma delicado, elegante, de média intensidade. Notas de ervas aromáticas (ex.: cidreira), flores de laranjeira, levemente herbáceo. Notas de mel, papaia, lichia, batata-doce e uvas moscatéis. Paladar fino, nítido, bem equilibrado, macio, agradável, de bom frescor e sutil doçura. A acidez é equilibrada, bom volume de boca, agradável e de ligeira persistência.
Vinícola Perini - amostra 358
Categoria: Tinto Fino Seco Jovem
9. GAMAY: coloração límpida, de média intensidade, tonalidade vermelho rubi. Aroma de média intensidade, vinoso, com notas de cereja, framboesa, amoras, frutas vermelhas, groselha e intenso morango. Paladar harmônico, com sutil doçura, agradável, leve, de médio corpo, redondo, equilibrado em acidez, jovial, de média persistência.
Vinícola Salton - amostra 319
Categoria: Tinto Fino Seco
10. TEROLDEGO: coloração brilhante, intensa, rubi intenso, com toques violáceos. Aroma nítido, fino, de média intensidade, com destacadas notas de frutas vermelhas - como a framboesa, amoras e ameixas - cassis, compota, geleia, cravo-da-índia, pimenta preta e mel. Paladar com um toque doce e equilibrado, de bom corpo e volume, média acidez, potente em álcool, taninos maduros e macios. Possui média persistência de sabor e retrogosto agradável.
Don Guerino - amostra 86
11. MERLOT: coloração de média/alta intensidade, tonalidade vermelho rubi/escuro. Aroma de boa intensidade, com notas de ameixa preta, carvalho, especiarias, chocolate, baunilha, destacadas notas de café, coco, pimenta preta, tostado e passas. Paladar com ataque sutilmente adocicado, de bom volume, acidez equilibrada, taninos de qualidade e marcantes, médio corpo, macio, de sabor intenso e de longa persistência.
Vinícola Almaúnica - amostra 200
12. CABERNET SAUVIGNON: coloração rubi intenso, vivo, com reflexos violáceos. Aroma de boa intensidade, com sutis notas de amora, eucalipto/mentol, cassis, pimenta preta, chocolate, cravo-da-índia, tostado, café e sutil vegetal. O paladar tem uma acidez pronunciada, marcante, é agradável e de média estrutura. Os taninos são firmes, marcantes, revelando um bom potencial de envelhecimento. O gosto é agradável, com retrogosto persistente.
Guatambu Estância do Vinho - amostra 255
13. CABERNET SAUVIGNON: coloração intensa, profunda, vermelho rubi intenso, com reflexos violáceos. Aroma de média intensidade, com notas de frutas vermelhas (framboesa e ameixa) e frutas negras. Também com notas de cassis, pimenta-preta, compota e, da madeira: especiarias, canela, baunilha e pão torrado. Possui um leve toque vegetal. No paladar tem um toque doce, com acidez equilibrada, bom corpo e estrutura. É potente, com leve adstringência, com bom potencial de envelhecimento e boa persistência.
Cooperativa Vinícola Aurora - amostra 172
14. MARSELAN: coloração bastante intensa, tonalidade vermelho-violáceo. Aroma intenso, complexo, com notas de frutas vermelhas (amoras, ameixas e framboesa), cassis, frutas escuras e especiarias - coco, chocolate/cacau, baunilha, cravo-da-índia, café e tostado. Paladar de bom ataque e equilíbrio; acidez marcante, corpo médio, sabor concentrado, de taninos maduros, de bom volume, boa estrutura, ainda com leve adstringência (revelando bom potencial de evolução), muito persistente de sabor.
Casa Valduga - amostra 152
15. TANNAT: excelente coloração, vermelho, com fortes traços violáceos. Aroma de boa intensidade, frutas vermelhas maduras, framboesa, ameixas, amoras pretas. Também, notas de compota, couro, eucalipto, menta, frutas passas, café e tostado, pimenta-do-reino. Paladar com ataque inicial doce, acidez moderada, bom corpo, média complexidade, boa estrutura. Sabor agradável, de boa persistência e com final de boca agradável.
Antonio Dias Vinhos Finos - amostra 225
16. TANNAT: coloração intensa, de tonalidade vermelho escuro, com tons violáceos intensos. Aroma de boa intensidade, com notas de cassis, geleia, compota, frutas vermelhas maduras, mirtilo e framboesa, amoras e ameixas passas. É complexo, com notas de baunilha, chocolate, pimenta-preta, madeira, tostado, menta e couro. O paladar é denso, com um ataque doce; é potente em álcool, de bom volume, aveludado, com taninos maduros, que atribuem um bom corpo e grande estrutura, e bom potencial de envelhecimento. O final de boca é longo e agradável.
Vinícola Almadén - amostra 401
A descrição sensorial foi elaborada pelos enólogos Mauro Celso Zanus, Magda Beatris Gatto Salvador e Odinéli Louzada dos Santos Corrêa. Todos da ABE.

Um comentário:

Francisco Pinto disse...

Excelente artigo, meu amigo Ucha. Um abraço.