quarta-feira, 28 de julho de 2010

Vinho brasileiro é caro, sim senhor!

Muitos produtores de vinho, que não me conhecem bem, me olham atravessado porque costumo dizer que os vinhos brasileiros bons são caros. Fiz uma palestra neste sentido, em Bento Gonçalves, e vários foram me contestar no coquetel que se seguiu. Naquela oportunidade, também falou a jornalista paulista Silvia Mascella Rosa, que, felizmente, para mim, tem opinião semelhante. Ela também acha os vinhos brasileiros caros. Eu também costumo comentar que o vinho brasileiro é muito mal distribuido pelo País. É difícil de encontrá-lo nas grandes cidades e quase impossível nas pequenas e distantes dos grandes centros.
Pois a Silvia Mascella Rosa, que tem um excelente Blog, denominado Vinho Verde Amarelo, e escreve na revista Adega, também concorda sobre a dificuldade de encontrar no mercado do dia a dia os bons vinhos que sabemos existir no País. Ambos sabemos, e concordamos com os produtores, que a carga tributária brasileira é muito alta sobre o nosso vinho e que os que vem do Mercosul são beneficiados por baixo imposto, mas não é só isso que encarece o produto nacional. Vou reproduzir o que ela escreveu no Blog, dia 21 de julho, sobre o assunto:
“Assunto Taninoso: O Preço dos Vinhos
Como boa jornalista que me esforço para ser, vou fazer como ensinam os bons professores de reportagem e redação em algumas (poucas) escolas e em algumas (poucas) redações sérias - vou fazer o possível para abordar os dois lados dessa taninosa questão.
Começo dizendo o que aconteceu para me fazer colocar no ar estas elocubrações.
Meu pai faz aniversário no próximo dia dos Pais, e vamos juntar um grupo de parentes para comer pizza e tomar vinho em meu apartamento. Das 15/16 pessoas que virão, somente duas não bebem vinho. Não há preconceituosos no grupo, então meus pensamentos encaminharam-se diretamente para os vinhos brasileiros. Comecei a fazer uma pesquisa de preço partindo de alguns princípios de harmonização e de observações que tenho do que esse grupo gosta/costuma beber.
Fico feliz em dizer que somos 'facinhos', muitas paixões nos agradam e nos entretêm de boa maneira. Então, passo a pensar no dinheiro disponível (que é um assunto ainda mais espinhoso do que taninoso) e na melhor forma de gastá-lo.
Para começar consulto via internet alguns vinhos tintos brasileiros que me agradam e que não são vinhos que pedem comidas mais sóbrias do que pizza.
Penso que colocar um valor máximo entre 35 e 40 reais por garrafa parece ser de bom tamanho. Por uma razão bastante simples: é o preço médio de muitas das pizzas de entrega de minha região. Um cálculo rápido me diz que cada garrafa é suficiente para 2 a 3 pessoas e a mesma coisa para as pizzas.
E vou aos vinhos, é aí é que a coisa começa a complicar.
1) não encontro para vender, senão nos sites das empresas, alguns dos vinhos que me agradam e estão nessa faixa de preço;
2) alguns vinhos estão mais baratos em lojas multimarcas, abertas para a rua e com pronta-entrega, do que no próprio site da vinícola, onde ainda tenho que pagar frete e esperar chegar;
3) outros vinhos estão surpreendentemente caros;
E aqui abro um parêntese:
Os vinhos brasileiros sofrem com uma tremenda carga tributária. Ela incide sobre todos os produtos industrializados e sua porcentagem (em alguns produtos) aparece nas notas dos supermercados, mas nós não estamos acostumados a olhar. Os americanos sabem o quanto pagam de imposto pois no final de cada nota está o valor da conta com e sem o imposto. Fica mais fácil ver, indignar-se e, quando possível, questionar o governo. Por aqui não dá...
Em vários casos os vinhos argentinos e chilenos chegam ao Brasil com uma carga tributária muito (mas muito mesmo) inferior à nossa e isso derruba os preços deles, além do fato de que para muitos atacadistas - donos de supermercados - isso representa uma economia ainda maior quando combinado com o volume que eles compram.
Imagino que já está ficando claro como a balança fica desequilibrada para os brasileiros na maioria dos casos.
Mas...também existe uma coisa intangível que é um pensamento de alguns produtores e de alguns consumidores que determina que se o vinho for barato ele imediatamente será associado a um vinho ruim.
Então, o vinho brasileiro com esse problema de auto-estima e de carga tributária fica na retaguarda da compra. E da prateleira.
Veja só, uma vez conversando com Fábio Miolo eu perguntei quanto do valor final de uma garrafa era, para o produtor a carga de impostos, e ele me falou que chegava a quase a metade do valor final dela.
Várias vezes depois disso eu fiz a mesma pergunta para outros produtores brasileiros e a resposta foi praticamente a mesma. Ou seja, em 750ml de vinho, 375 ml são para o governo.
Onde essa conta não encaixa é no seguinte, vou dar um exemplo para ilustrar: na loja da Salton, lá em Tuiuty, uma garrafa do vinho premium deles, custa quase 50 reais (o vinho vale cada centavo, diga-se) e hoje eu vi esse mesmo vinho no supermercado Extra por R$ 69,00. É claro que o supermercado paga menos de 50 reais cada garrafa, deve pagar algo em torno de 42 reais. Mais os "bônus" que as empresas tem que dar para conseguir que seu produto esteja naquele supermercado. Assim, suponhamos que seja esse o valor (R$ 42,00) só para efeito de cálculo. Sabe quanto eles colocaram a mais para pôr o vinho na prateleira? 65%.
Que tal? Daí que hoje eu estava lá no Extra e fiz o que sempre faço, deixei-me ficar na seção de vinhos observando preços, promoções, pessoas e perguntas (os 4 'P's do varejo). Como é 4a feira e eles fazem algumas promoções de hortifrutis, é sempre um dia movimentado.
E as pessoas estavam comprando vinhos. E não era pouco não. Sabe por que? A linha básica Santa Carolina estava por um 16 ou 17 reais cada garrafa. Se você levasse três garrafas o preço cairia para 15 reais.
Vamos combinar que não dá para concorrer com isso?
Óbvio que o vinho da Salton que usei para base de cálculo é tremendamente melhor do que esse Santa Carolina genérico (a Santa Carolina também tem vinhos bons, mas não eram esses). Mas a IMENSA maioria das pessoas não sabe disso.
Elas vêem o vinho brasileiro nas prateleiras, não diferenciam uma porcariada de uvas de mesa misturadas com 'só um químico sabe o quê' por 8 reais, sobem os olhos e vêem um vinho fino por 33 reais, sobem mais ainda e vêem um por 70 reais. É tudo brasileiro, um país de cachaça, futebol meia-boca e vinhos de garrafão. Por que ela vai pagar 70 reais? Por que ela vai se dar ao trabalho (e custo) de provar um de 33 reais que ela não conhece se ao lado existem os argentinos e os chilenos por 18,19,20 reais, com fama e em promoção?
A primeira frase deste blog afirma que falo de vinhos brasileiros com um pouco de parcialidade e que existem bons vinhos em muitos terroirs.
Então, não estou desmerecendo Argentina, Chile, Brasil, Portugal etc com seus bons vinhos. Nem estou querendo que vinhos de alta gama custem 30 reais. Só estou altamente indignada com a injustiça das prateleiras. Com a exploração que presta um enorme deserviço ao mundo do vinho. E não vou nem falar de restaurantes, isso fica para outro post.
Meus conhecidos do Ibravin ficam bravos quando digo que o vinho brasileiro custa caro. Custa sim, para o consumidor final médio (como eu, a dona de casa, que quer dar uma festinha gostosa sem comprometer o orçamento, provar uma novidade aqui e ali) que compra vinho no supermercado por que é onde tem (sério gente, pegar o carro em São Paulo e percorrer 15/20km para ir a uma revenda de um vinho brasileiro é coisa de doido). Para gente como eu o vinho brasileiro custa caro e é difícil de achar.
Não sou política e nem tenho nada a ver com isso, mas não é possível que alguma coisa não possa ser feita a esse respeito.
Mas vou dar uma aliviada no discurso senão amanhã vou receber uma enxurrada de emails dizendo que não é bem assim. Outros fatos: o Ibravin tem feito um trabalho duro e sério para que as pessoas provem os bons vinhos brasileiros. Esse trabalho vem dando resultado, mas é vagaroso e fica algumas vezes amarrado na falta de opções por conta da péssima distribuição. Parafraseando Milton Nascimento: O vinho tem que ir onde o consumidor está.
Outra, a Miolo comprou a Almadén precisamente para entrar nesse segmento dos vinhos bons e baratos e aos poucos começa a aparecer nas prateleiras. A Salton vem fazendo alterações em sua linha Classic para conseguir vinhos vivazes e agradáveis em uma faixa mais acessível. A Piagentini vem fazendo mudanças importantes em sua linha, para mudar a imagem de seus vinhos. A qualidade das novas linhas já melhorou e muito. Alguns rótulos da Aurora também evoluiram. Casa Valduga não vende em supermercado, então não posso comentar.
Mas e os outros? E os vinhos entre 35 e 40 reais que eu queria comprar? Pior, e os de 25 reais? Onde eles estão? Não sei. Para conseguí-los tenho que encomendar em um conhecido aqui, um produtor alí etc. Ou seja, fazer umas 5 comprinhas para conseguir uma dúzia de vinhos brasileiros que eu gosto. Complica não?
Os 'hermanos' estão todos lá. Poderosos, baratos e no mesmo lugar. E alguns na faixa de 25/30 reais são bem bons, perfeitos para acompanhar a pizza descompromissada.
Pensem à respeito, consumidores, produtores, distribuidores, políticos. Eu estou em SP, a cidade onde vocês todos sonham em vender seus vinhos. Quero comprá-los e não os encontro, ou então faço contas e acho que alguém, além do governo, está de sacanagem comigo.
Bons pensamentos, sem brinde, pois caso não tenham percebido, estou indignada!

P.S: Pai, não se preocupe, os vinhos de seu jantar já foram encomendados/comprados.”

5 comentários:

OC disse...

Sílvia,
bem-vinda à esta briga sem glória e sem esperança de sucesso.
Alguns poucos tentamos, há anos, sensibilizar produtores, comerciantes e governo para a triste situação que tão bem explicitaste. Eu mesmo, sempre que há uma festa (e minha mulher adora festas grandes!) tento encontrar primeiro um vinho nacional dentro do budget. A última foi a Festa Julina do dia 24 último, onde não deu para vinho brasileiro de 10 reais a garrafa para 300 pessoas. Tive de trazer um Tannat/CS de Rivera, das Viñas del 636 por...5 reais o litro. Não há nada igual ao 636 no Brasil por 15 reais o litro.
Sábado teremos uma costela e paleta de cordeiro do Pedregal, de Livramento, a melhor das carnes de carneiro, que será preparada por mineiros para ver como fica na mão dos outros. E o vinho? Precisava-se de algo especial que ombreasse com o broutard e o budget para 10 garrafas (15 pessoas) é de 500 reais. Depois de muito batalhar, muito mesmo, e não encontrar, fui supreendido com o preço do Salton Talento em um Supermercado local (o Mundial), onde está à venda por R$45,50. Esses portugueses do Mundial são comerciantes bastante razoáveis, a margem deles é sempre sensata e vendem muito.
Eu particularmente acho que o problema maior do preço do vinho brasileiro está, na grande maioria dos casos, no final da cadeia, no ponto de venda de varejo e nos restaurantes. É impensável para eles um markup abaixo de 50% no caso dos primeiros e 100% no caso dos últimos. Com essa "filosofia" de beira de estrada e o nossos altos custos, o preço para o consumidor final torna-se surreal.
Então, com 45 reais pelo Talento estamos não competitivos, mas ao menos dentro do jogo.
Mesmo assim perdemos de goleada para um Chateau Peyros do Madiran e um Cuna de Piedra de San Juan, Uruguai (equivalentes do Talento a R$25,00).
No final, dei uma de DNIT, abandonei a concorrência pública e comprei o brasileiro por "critérios técnicos" (era de casa), pois cabia no bolso e sobrava troco.
Será sábado, segunda eu conto como foi.
Um abraço, parabéns, siga lúcida e não vá trabalhar para nenhuma vinícola ou loja de vinhos.

Olyr Corrêa

OC disse...

Sílvia,
bem-vinda à esta briga sem glória e sem esperança de sucessos.
Alguns poucos tentamos há anos sensibilizar produtores, comerciantes e governo para a triste situação que tão bem explicitaste. Eu mesmo, sempre que há uma festa (e minha mulher adora festas grandes!)tento encontrar primeiro um vinho nacional dentro do budget. A última foi a Festa Julina do dia 24 último, onde não deu para vinho de 10 reais a garrafa. Tive de trazer um Tannat/CS de Rivera, das Viñas del 636 por...5 reais o litro. Não há nada igual a isso no Brasil por 15 reais o litro.
Sábado temos uma costela e paleta de cordeiro do Pedregal, em Livramento, a melhor das carnes de carneiro, que será preparada por mineiros para ver como fica. E o vinho? Precisava-se dea lgo especial e o Budget para 10 garrafas (15 pessoas) era de 500 reais. Depois de muito batalhar, muito mesmo, e não encontrar fui supreendido com o preço do Salton Talento em um Supermercado local (o Mundial) onde está à venda por R$45,50. Esses portugueses do Mundial são comerciantes bastante razoáveis e a margem deles é sempre sensata. Eu particularmente acho que o problema maior do preço do vinho brasileiro está, na grande maioria dos casos, no final da cadeia, no ponto de venda de varejo e nos restaurantes. É impensável para eles um markup abaixo de 50% no caso dos primeiros e 100% no caso dos últimos.
Então, com 45 reais pelo Talento pelo estamos não competitivos, mas ao menos dentro do jogo.
Mesmo assim perdemos de goleada para um Chateau Peyros do Madiran e um Cuna de Piedra de San Juan, Uruguai(equivalentes do Talento a R$25,00). No final, dei uma de DNIT e abandonei a concorrência pública e comprei o brasileiro por "critérios".
Será sábado, segunda eu conto como foi.
Um abraço, parabéns, siga lúcida e não vá trabalhar para nenhuma vinícola ou loja de vinhos.

Olyr Corrêa

Silvia Mascella Rosa disse...

Ah! Olyr, as lutas inglórias são tantas...
Mas sabe que há alguma luz no fundo da taça!
Antes de mais nada obrigado pelas boas vindas e boa festa sábado, claro!
Tive uma reunião muito boa com o Márcio Marson na segunda-feira e até coloquei no blog, onde discutimos esse e outros assuntos.
Uma de nossas 'batalhas' é para que as pessoas ao menos SAIBAM que existem alternativas (isso falando de consumidor em relação ao vinho brasileiro) e outra é que os produtores tenham claro 'o porquê' de perderem tantas disputas - seus preços não são competitivos. Corram atrás.
É como adesivo de caminhão: "Não me Inveje, Trabalhe".
É preciso atacar na frente da informação e na frente tática, descobrindo na mesa de negociações como modificar essas leis retrógradas (e modificar constumes antigos que dizem que se vender um pouquinho tá bom...).
Meu mentor e padrinho, Carlos Cabral, costuma dizer sobre o varejo que é fácil vender a primeira garrafa. Difícil é vender a segunda.
Grande abraço!

Anônimo disse...

Ola Olyr...

Espero que você tenha se dado o trabalho de segundos de pegar este texto que você escreveu aqui no Blog e mandar um cópia ao governo... é lá que esta o problema e gostaria muito de você como cidadão brasileiro (não uruguaio acredito)lembra-se as pessoas competentes, seja cidadão, faça alguma coisa além de criticar, não sou do ramo de vinhos, mas não acredito que as vinícolas investem tanto em tecnologia queiram ferrar seus consumidores, no texto acima a escritora diz pagar R$ 40,00 em uma PIZZA.. eu disse uma PIZZA.. vc realmente acredita ser mais barato fazer uma garrafa de vinho seja ela qual for do que uma PIZZA?

Desculpem o desabafo, mas sou brasileiro...

OC disse...

Anônimo,

sou brasileiro, também, além de argentino, uruguaio e paraguaio. Nós, guaranis, temos nossa pátria ocupada por invasores europeus e portanto não enxergamos fronteiras.
Sim, já mandei ao governo brasileiro, e outras organizações, sugestões mais bem redatadas que esta a que fazes referência. Não é reclamação. É denúncia. E também vão sugestões junto.
Como esta que mandei quando da reunião de Lula com a Apex e que pode ser lida aqui:

http://tinyurl.com/ydugebl

Quanto à pizza, tens a maior razão, como também serve de paralelo um litro de Coca Cola ser mais caro do que um litro de vinho popular no produtor.
Reclame, denuncie. Um dia escutarão.
E não acho que o problema esteja só no governo...