Nosso leitor Paulo de Tarso Santos Martins nos envia um interessando artigo escrito por um especialista em ovinocultura, Keni Eduardo Zanoni Nubiato - Zootecnista - Mestrando - Produção Animal - Universidade Federal da Grande Dourados - UFGD.
“A carne ovina é vista como um produto premium e seu consumo é ligado à população de maior poder aquisitivo, desta forma, esse produto também é ambicionado pela parcela da população que tem obtido incremento de renda recentemente. Ao contrário do panorama comercial favorável, a carne ovina deixa de ganhar mercado pela falta de padronização e qualidade no momento que esta chega ao consumidor. Sendo assim, a cadeia produtiva precisa se organizar para oferecer um produto que proporcione satisfação a consumidor e possa assim, competir com outros produtos cárneos tradicionalmente mais aceitos.
O confinamento pode ser uma alternativa para a terminação de cordeiros, fazendo com que estes animais atinjam a conformação e o acabamento adequado para o abate em menor tempo, proporcionando carcaças padronizadas e de melhor qualidade. Neste sistema de terminação, diversos alimentos podem ser utilizados para formular as rações que atendam as exigências dos animais. Uma das alternativas é o grão de soja que apresenta elevado teor proteico e energético. No entanto a soja em sua forma in natura apresenta fatores antinutricionais, como a sojina e a uréase que dificultam o seu máximo aproveitamento nutricional, podendo retardar o potencial de crescimento e desenvolvimento dos animais (Barbosa, 2004).
Porém como alternativa, o processamento da soja integral ou grão de soja desativado, promove inativação dos fatores antinutricionais, que ocorre principalmente devido ao aumento da temperatura e da pressão, juntamente com um baixo teor de umidade (8%), proporcionando o aquecimento do grão, tornando-o mais digestível, caracterizando a desativação do grão de soja (Mendes, 2004).
Nesse contexto, foi desenvolvido um experimento no setor de Ovinocultura da Faculdade de Ciências Agrárias da Universidade Federal da Grande Dourados, no município de Dourados- MS, objetivando avaliar as características qualitativas da carne de cordeiros terminados em sistema de confinamento, alimentados com soja desativada e diferentes proporções de concentrado.
Foram utilizados 20 cordeiros não castrados, sem raça definida, com média de idade de 120 dias e 22 kg de peso corporal médio, sendo estes terminados em confinamento com quatro dietas diferentes: 1ª = 50% de grão de soja in natura; 2ª = 80% de grão de soja in natura; 3ª = 50% de grão de soja desativado e 4ª = 80% de grão de soja desativado. As dietas foram isoenergéticas e isoproteicas (65% NDT e 16% PB com base na matéria seca respectivamente) e compostas com feno de capim Brachiaria brizantha cv BRS Piatã .
Os animais foram abatidos ao atingirem a condição corporal 3 (indicativo de bom acabamento e distribuição da gordura), sendo esta avaliação realizada pela palpação dos pontos anatômicos: base da Cola, ao longo das apófises espinhosas lombares, ao longo das apófises espinhosas dorsais, ao longo do esterno, buscando uma uniformidade na distribuição de gordura (Osório e Osório, 2005).
Para análise sensorial, foram utilizadas amostras assadas do lombo e submetidas à degustação por provadores não treinados, os quais classificaram a carne quanto ao odor, sabor, maciez e avaliação da forma global, sendo esta última característica definida como uma análise geral de todas as outras características em conjunto.
Na avaliação da característica sensorial "odor" foi apresentando maior aceitação dos provadores para a carne dos cordeiros alimentados com dieta à base de soja desativada, independentemente do nível de concentrado na dieta. Segundo Osório et al. (2009) os machos inteiros apresentam aroma mais intenso, tanto na carne como na gordura. Como no experimento foram utilizados machos não castrados e o painel sensorial foi composto por provadores não treinados, este fator pode ter influenciado negativamente no momento da degustação devido ao preconceito existente em relação a carne ovina.
Para a característica sensorial "sabor" a carne dos animais alimentados com soja desativada com 80% de concentrado foi a melhor avaliada pelos provadores. Muitas vezes, o sabor da carne está relacionado com o seu grau de marmoreio, que é relação inversa com a força de cisalhamento e é diretamente proporcional a melhores avaliações de sabor, aroma e suculência. Sabores e odores característicos da carne podem ser originados de substâncias presentes nos alimentos que compõem a dieta animal, sendo depositados nos tecidos via ingestão dos mesmos.
Na característica sensorial "maciez", a carne dos cordeiros do tratamento soja in natura 50% apresentou-se como a carne de menor preferência pelos provadores. Diferentemente desta, observou-se uma preferência pela carne dos animais submetidos aos tratamentos soja in natura 80% e desativada 50% e 80%.
Osório et al. (2009) afirmaram que a maciez da carne esta relacionada com a perda de exsudato no momento de seu cozimento, que por sua vez apresenta ligação com a capacidade de retenção de água da mesma. Sendo assim, carnes com menor capacidade de retenção água tendem a eliminar mais água no momento do preparo, que por sua vez resultam em uma carne mais seca e menos suculenta.
A avaliação da "forma global" caracterizou a carne dos animais submetidos a dieta soja in natura e 80% de concentrado como uma carne de menor interesse para os provadores. Em contra partida, a carne dos animais submetidos às dietas soja desativada com 80% e 50% de concentrado foi mais bem aceita pelos provadores. De forma geral, observou-se uma melhor aceitação da carne dos animais alimentados com dietas a base de soja desativada, independentemente do nível de concentrado na dieta. No entanto vale ressaltar que a aceitabilidade de um produto é variável entre os consumidores de diferentes regiões.
Em trabalho publicado por Sañudo et al. (2007), os autores constataram variações entre consumidores de países europeus quanto à aceitação da carne ovina, de modo que as características de sabor, suculência, maciez e odor durante o cozimento, apresentaram diferenças para tipo de cordeiro, país de procedência dos provadores e suas correlações. Sendo assim, existe a necessidade do conhecimento dos hábitos comerciais, culturais, regionais e culinários na implantação de sistemas de produção de carne.
Os provadores apresentaram preferência pela carne dos animais alimentados com soja desativada, comprovando que houve diferença nas características sensoriais para os diferentes tratamentos, concluindo-se que o tipo de dieta fornecida aos animais pode interferir nos aspectos sensoriais da carne.
Referências bibliográficas:
BARBOSA, F.A. Alimentos na nutrição de bovinos. Disponível em: http://www.agronomia.com.br/artigos_nutricao_bovinos.html. Acesso em agosto de 2012.
MENDES, W. S.; SILVA, I.J.; FONTES, D.O. et al. Composição química e valor nutritivo da soja crua e submetida a diferentes processamentos térmicos para suínos em crescimento. Arquivo Brasileiro Medicina Veterinária Zootecnia, n.56, p.207-213, 2004.
OSÓRIO, J.C.S.; OSÓRIO ,M.T.M. Produção de carne ovina: Técnicas de avaliação "in vivo" e na carcaça. 2a ed. Pelotas: Universidade Federal de Pelotas. Ed. Universitária, p.25-32, 2005.
OSÓRIO, J.C.S; OSÓRIO, M.T.M.; SAÑUDO, C. Características sensoriais da carne ovina. Revista Brasileira de Zootecnia, v.38, p.292-300, 2009. (Suplemento Especial).
SAÑUDO, C.; ALFONSO, M.; SAN JULIAN, R. et al. Regional variation in the hedonic evaluation of lamb meat from diverse production systems by consumers in six European countries. Meat Science, v.75, p.610-621, 2007.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário